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A mão e a Luva

  • Foto do escritor: Fernando Carlos
    Fernando Carlos
  • 8 de mai. de 2019
  • 5 min de leitura

Machado de Assis, assim como seu ídolo José de Alencar, fez uma trilogia do perfil feminino: Helena, A mão e a Luva e Iaiá Garcia.

Hoje iremos abordar a segunda obra da trilogia, a Mão e as Luva escrita em 1874, ainda no estilo Romântico, mas sendo Machado de Assis, sempre com aquele tom irônico e crítico.

A história mostra novamente uma menina órfã chamada Guiomar, que foi adotada e educada na melhor família da sociedade e é bem a história de Helena, a menina órfã de mãe, pois como já sabemos, seu pai (Salvador) era vivo ainda, mas muito pobre e quem bancou os estudos dela, embora num orfanato e depois por testamento ganhou o título de Baronesa foi o pai de Estácio. O que ninguém imaginaria é que Estácio e Helena iriam se apaixonar. Como ele achava que eram irmãos, deixou para lá, mas quando descobriu que o verdadeiro pai não era o pai dele, ele teria a chance de pedir Helena em casamento por amor, mas as convenções sociais fizeram com que ele optasse em seguir a RAZÃO E A LOGICA, que a paixão.

Helena também teve que seguir seu destino social, já que naquela época a mulher não poderia escolher, mas sim se submeter as regras sociais, veja que somente Estácio poderia escolher entre o amor e as convenções sociais e escolheu pela segunda, dando o título de nobreza que Helena ganhou pelo testamento após a morte do pai de Estácio. Ele não poderia ter feito isso em vida, também pelas convenções sociais, enfim, é uma obra brilhante do gênio Machado de Assis.


Feitas tais considerações, voltamos para a História de Guiomar que teve um outro destino do personagem de Helena, mas as características da heroína são as mesmas e a motivação da adoção seja que ela realize um casamento, já que sua mãe adotiva é uma baronesa, portanto estamos falando da nobreza do Rio de Janeiro. Guiomar é linda, pura, sensível, culta, atraente e chama a atenção de três homens distintos que desejam casar-se com ela e portanto o autor nos brinca com três perfis masculinos nessa obra e algo diferente de Helena no perfil feminino, como iremos abordar nas conclusões.

O primeiro “tipo” de personagem está representado por Estevão, um homem fraco, vacilante, indeciso, nascido mais para derrotas do que para vitórias e que se apaixona pela primeira vez a vê. Ela está com apenas 17 anos e vive somente pela emoção, mas não tem ambições ou determinações para sua vida, ele se apaixona a primeira vista por Guiomar.

O segundo é Luis Alves, oposto do primeiro, ele é guiado pela razão e não pela emoção, pois é extremamente ambicioso e quando conhece Guiomar, logo se apaixona, porque ela se mostra como ele, ambiciosa e racional e portanto vem a expressão “A mão e a luva,” quer dizer, uma se encaixa perfeitamente na outra.

O terceiro personagem é Jorge que aqui representa a nobreza, "vivendo do pecúlio que dos pais herdara e das esperanças que tinha na afeição da baronesa", inclusive o nome Jorge nos remete ao nome do Rei da Inglaterra George, que nessa época tinha grande poder político sobre nós, mas enfim, esse nosso Jorge é o típico nobre preguiçoso, tem um amor "pueril e lascivo", como descreve o próprio Machado de Assis. Como é filho de um Barão e portanto se pensarmos na luva que veste a mão perfeitamente ele também seria uma pessoa ideal para casar-se com Guiomar, já que sua mãe adotiva era uma baronesa e é certo que ela escolheu esse para se casar com Guiomar e dar continuidade as convenções sociais e é ai que a história nos mostra o outro lado da personagem feminino, pois no caso de Helena, ela teve que se conformar em casar-se com Luis, o escolhido pelo seu meio irmão Estácio, no sentido de seguir o rito, dar um título de nobreza merecido para Helena e manter a herança que ela recebeu.


Guiomar teria que se submeter ao casamento arrumado pela Baronesa e se casar com Jorge, futuro barão ou escolher Estevão, um homem fraco, mas que a amava de paixão e daria sua vida por ela, ou um homem mais maduro e ambicioso como ela, Luis Alves e é esse que ela escolhe, vejam, ela quem escolhe dessa vez e usa de malícia e inteligência para conseguir manipular sua madrasta que aceita e consente que ela se casa com Luis Alves e o casamento se dá.

O que Machado de Assis nos revela depois do casamento, com enredo rocambolesco, pleno de coincidência, reviravoltas, surpresas, suspenses é a personalidade forte e misteriosa de Guiomar. Quando estão finalmente juntos, ele fala que está feliz por conseguir casar-se com uma mulher tão inteligente, bela e santa. Ela para, olha para ele e diz: Eu não sou santa coisa nenhuma, sou ambiciosa como você e desejo ascender socialmente.

Bom, isso é algo novo no cenário da literatura nacional, uma mulher mostrar que tem opinião, que não é a virgem pura dos lábios de mel não, quer dizer, Machado de Assis começa a mostrar um desejo de revelar a verdadeira mulher brasileira, mas as coisas não vão para um extremo e assim como em todas as obras do autor, fica apenas implícito suas mensagens, com uma elegância estilística que continuaria aperfeiçoando até atingir seus píncaros na chamada "fase realista," mas aqui já temos algo novo no cenário literário e apontando para esse novo estilo de escrever que se revelará na obra Dom Casmurro, assumidamente um romance no estilo do Realismo.


Uma característica que Machado de Assis sempre vai continuar fazendo em suas obras falar com o leitor através do narrador, já vimos isso com Auguste Flaubert. Aqui o narrador em terceira pessoa descreve a cena e no meio da descrição ele começa a conversar com a leitora como podemos ver nesse trecho: “Guiomar passou da poltrona à janela, que abriu toda, para contemplar a noite — o luar que batia nas águas, o céu sereno e eterno. Eterno, sim, eterno, LEITORA MINHA, que é a mais desconsoladora lição que nos poderia dar Deus, no meio das nossas agitações, lutas, ânsias, paixões insaciáveis, dores de um dia, gozos de um instante, que se acabam e passam conosco, debaixo daquela azul eternidade, impassível e muda como a morte”.


Esse romance nao foi tão bem aceito pela crítica e nem pelos leitores e foi reeditado somente 33 anos depois, o que motivou a guinada de Machado escrever seu romance seguinte, Helena com uma trama bem mais folhetinesca, publicado em 1876. Aqui pouco temos da sutileza psicológica dos dois primeiros romances (ressureição e a mão e a luva), verdadeiros estudos de mulheres, ou da sutileza filosófica dos romances da fase madura de Machado.


 
 
 

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