A Vênus das Peles. Resumo.
- Fernando Carlos
- 2 de jan. de 2019
- 10 min de leitura
Autor Leopold Von Sacher-Masoch

A obra inicia com Severino tendo um sonho com a deusa romana do amor Venus, uma estátua de mármore vestida com casaco de peles. Nesse sonho ele pergunta por que a deusa do amor é tão cruel e infiel? Ela diz que os homens as tratam como objetos e naturalmente são infiéis e, portanto os direitos das mulheres devem ser na mesma moeda e cruel porque a mulher é assim tratada pelo homem, o que dá o direito de uma Deusa, que representa a mulher a também sê-lo. Nesse sonho já mostra o desejo erótico que o autor deseja para ele mesmo: “Nada pode excitar mais do que as imagem de uma déspota bela, voluptuosa e cruel, arrogante favorita, desapiedada por capricho”. A imagem que ele se refere é referência a um quadro que está na parede de sua casa do último caso amoroso , que no decorrer da história, será citado: O quadro “A Venus das Peles”.

Quando é acordado, recebe a visita de um amigo, a quem vai contar sua história do porque ele trata mal suas criadas. Ele conta que conheceu Wanda Dunaiew, uma jovem viúva que morava na vizinhança e que outrora pediu um livro emprestado a Severino e lá havia uma foto de um quadro de Ticiano “A Vênus” e no verso ele havia escrito seus desejos eróticos “veste as peles de déspota... Deusa cruel de amor e beleza... como todos os Deuses gregos, um demônio disfarçado” e ela sem querer leu e percebe que Severino deseja realmente isso e passa a se interessar em conhecer essa deusa cruel, que ele crioui em sua mente.
Wanda procura se aproximar de Severino deixando-se ser assediada e isso prontamente acontece. Ela pergunta o por que ele escreveu aquilo na foto do quadro de Ticiano e ele explica, sem exitar que deseja realmente que sua mulher o trate como um serviçal submisso e ele a trate como essa deusa. Para ele isso é o máximo de entrega ao amor, entrega de corpo e alma, mas com a condição que ela use sempre casacos de peles, um fetiche.

A trama segue com uma negociação complexa e inusual, já que na época, quem é superior numa relação a dois sempre foi o Homem, mas ele está propondo o oposto, que ele seja o escravo dela. Quando falamos escravo, estamos nos referindo a um ser objetal nos moldes da antiguidade, onde se é comprado e tratado como uma posse, um objeto ou como animal, isto é, desumanizado. Inicialmente ela se faz de tolas, acha ridículo, esperando que ele se entregue mais, que descubra qual o mistério nessa proposta vinde de alguém que tem tudo para ter o inverso e fale realmente qual é a intenção dessa entrega total e irrestrita. Claro que a todo o momento ela deseja essa entrega, mas devido à época e as conversões sociais, ele sendo um nobre, poderia colocá-la em maus lençóis, caso desejasse, a qualquer momento. Onde se viu um homem desejar ser escravo de uma mulher que mal conheceu?

Mas depois de muitas negociações, poemas, declarações de que ele realmente estava falando a sério e tinha esse prazer incomum em servir uma mulher cruel, contanto que usasse peles, além de todas as confissões de seus desejos eróticos, sonhos incluindo o prazer que sente em ser castigado fisicamente, mais que isso, até ser traído com outro homem, considerado por ele mesmo como sendo o ápice da crueldade, o acordo é aceito por ambos, um contrato de escravidão real seria redigido conforma as normas da época e condições das partes, mas para validar tal contrato, eles teriam que ir para um país que ainda se aceitava a servidão. Ele teria que mudar de nome, passaria a ser chamado de Gregório.

Ele se entregou como escravo, objeto, brinquedo ou o que ela desejasse fazer com sua pessoa, inclusive a possibilidade dela decidir matá-lo, caso fosse preciso. Ela concorda com tudo e diz que agora sim conhece a natureza dele, de cão, que lambe os pés de quem o castiga e o maltrata. Dessa forma, ela incorpora a tão desejada Deusa das Peles que Severino sempre sonhou e escreveu pelos quatro cantos.
Ela passa a ser uma mulher fria, déspota e cruel e o trataria com escravo como nem ele imaginaria.

Deu ordens, agora como Senhora do servo, para preparar tudo para uma viagem imediatamente e disse querer ir para Itália e mandou que ele arrumasse tudo, carregasse a bagagem. Ela iria na primeira classe no trem e ele juntamente com os outros criados vestido a caráter num vagão que cheirava fumo. Ele somente a via de longe nas paradas que o trem fazia, sempre cercada de jovens a gargalhar e conversar. São muitas cenas de humilhação da parte dela e excitação da parte dele que acontecem, mas coisa é obvia, ele incorpora um verdadeiro servo, leva a bagagem prá la e prá cá, atende os mandos dela e quando vão para um o hotel, ele dorme com os criados, enquanto ela no melhor quarto e só entra quando ela o chama, leva bofetadas quando comete algum engano e cuida de seus cabelos, roupas e sapatos como seu criado e do quarto como uma camareira.

Numa parada em Viena ela sai para comprar chicotes e ele a acompanha e sente um misto de excitação e medo, pois os chicotes são para couro duro de cavalo, e não para ser humano. Passam por Florença, ela vestida como uma nobre e ele com roupas surradas de serviçal. As humilhações acontecem novamente e cada vez com mais requintes de crueldades e a qualquer momento possível, no quarto ele tem que beijar-lhe as mãos, e se curvar como servo ou ajoelhar-se ao seu comando beijando-lhe os pés e obedecer tudo que ela mandar.
Em Florença é que iria se dar a formalização do contrato de escravidão, as assinaturas do manuscrito já pronto. Ela aluga uma vila e ele iria dormir no quarto no piso inferior destinado aos criados e ela num andar superior.

Wanda pede que reveja o contrato, já previamente acordado e entrega um segundo manuscrito redigido por ela, que na verdade era uma carta de despedida da vida, de suicídio, caso ela o matasse de fato era preciso provas de que não foi ela e sim um desejo dele e lá estava escrito:
“Cansado das dissipações de um ano de existência, ponho livremente fim a minha vida inútil”. Ele ficou horrorizado, quando leu mas decidiu copiar com sua própria letra e assinou e entregou a ela que, agora o tinha definitivamente a sua mercê, nas suas mãos, ou melhor, a seus pés. Pegou-lhe o passaporte dele, para que não pudesse fugir das obrigações do contrato e todo dinheiro que ele possuía. Ele ajoelhou a seus pés, mas ela o empurrou, jogando-o para traz, tocou uma campainha e entraram 3 negras com cordas, o ataram de pé numa coluna na casa, mãos e corpo.

Wanda segurava um chicote nas mãos, tirou seu casaco de peles e o cobriu de chicotadas que ele descreve como uma folha de faca entrando na sua carne. Os golpes choviam duros e rápidos com espantosa violência sobre o dorso, braços, pescoço e região dos rins. Quando o chicote acertou seu rosto, começou um sangramento, ela desatou a rir, sem deixar de surrá-lo. Em cada golpe, Severino sente mais prazer e ela continua até que cansa. Ele não geme nem grita, cada vez mais excitado com a surra e a cada lambada, aumentava mais o prazer.
Após desatado, ela manda que ajoelhe e beije seus pés e ele o faz com sofreguidão e paixão. Ela diz: “Isso é para você aprender a me respeitar e o quanto eu posso ser cruel se aborrecida. Não vai me ver por um mês e a partir de agora cuidará do meu jardim”.
Ela está livre para fazer o que deseja e passa a flertar com outros homens ou até pretendentes convoca a presença de Gregório para ser seu alcoviteiro ou garoto de recados.

O primeiro é um príncipe, a quem ela manda Gregório levar-lhe uma carta. Ele é convidado para almoçar e Gregório serve os dois, acontece um erro na refeição, cai um guardanapo e ela dá um bofetão seguido de sangramento no rosto e ambos, o príncipe e ela dão risadas.
Não dura muito esse relacionamento, Wanda fica entediada e deixa de torturar Gregório por pura crueldade, já que ela sabe que ele necessita disso. Certo dia ela prepara um castigo. Ela diz: “Aborrece-me e não chega a me distrair 2 horas seguidas. Não me fitas assim” Ela o empurra com o pé e continua: “Não é o que desejo, você não é um homem, é um verme, uma coisa”.

Wanda chama as negras e manda atar as mãos de Gregório as costas e mantê-lo de joelhos fora da casa onde temos uma plantação de trigo. Depois ataram-no a um poste e picaram seu corpo com agulhas afim de torturarem. Wanda chega e com olhar frio ordena que, com os braços amarrados as costas, Gregório puxasse o arado como um boi na plantação de trigo. As negras colocaram a canga no pescoço dele e ele o fez, sendo puxado por uma corda por uma delas e ao mesmo tempo chicoteado por outra negra enquanto sua dona o observava até o fim do dia.

No dia seguinte, ela não permitiu que ele tomasse café junto dela, somente a servisse como criado e mostrava-se mal humorada. Foi ai que percebeu que Gregório observava a uma das negras que também estava servindo-a com muita atenção e imediatamente, com ciúmes ou puramente desejo de castigá-lo, deu-lhe uma chicotada no rosto, chamou as outras negras, mandou que o amarrasse e colocasse no quartinho do curral, uma possível prisão, que dormisse na palha, sangrando, sem comida, sem água, sem luz ou repouso e ele ficou por lá sem ter a noção de quanto tempo e quando ela vai soltá-lo ironiza: Ainda vive?

No dia seguinte ela quer ir ao cassino, pois necessita de outro homem que a adore para excitar Gregório, já que ele tinha prazer em sentir ciúmes da amada Wanda. Lá ela faz amizade com um pintos francês que se prontificou a pintar um quadro dela e Gregório ficaria somente lá fora da casa cuidando do jardim enquanto a pintura se realizava.
Ela acabou por enfeitiçar o pintor, sentada no sofá, seminua, vestidas com as peles fez com que mais um homem estaria a seus pés desejando ser seu escravo. Gregório percebe e indaga numa outra oportunidade se ela deseja o pintor como sua nova conquista (presa), enfim, se ela o ama e ela o desdém: “Eu não amo mais ninguém, amei você um dia e até foi despótica contigo para deleitar a sua fantasia.

Quando acabar minha simpatia ou serei tão cruel, desapiedada, selvagem contigo ou te darei a liberdade e serei indiferente ou amarei outro homem”. Ele mantém o desejo de continuar sendo seu escravo, mesmo que ela o mate, mas que ela não impeça ele de ficar longe da sua presença.

O relacionamento com o jovem pintor continua, pois ele estabelece seu estúdio na vila de Wanda para pintá-la diariamente, quando num desses dias, ela o provoca mais ainda. Wanda chama Gregório, está vestida com a pele, estira-se no sofá e com o rosto diabólico manda que Gregório deite-se no chão estendido a seus pés e ela coloca um dos pés sobre sua cabeça causando espanto e susto no pintor, que fica completamente transtornado com a cena, mas pelo rubor no rosto, ele estava adorando e como era de se esperar, o pintor diz que não consegue mais pintar e implora que ela use o chicote nele e ela o faz com prazer.

Ela o ata no chão e o chicoteia com vigor. Quando seus olhos já mostram um pedido de piedade, ela manda Gregório para o quarto, que se esconda atrás de uma cortina e fique lá esperando. Ela irá levar o pintor para lá. Assim que ela afaga o pintor em seu peito, Gregório assiste a tudo extasiado, mas em seguida ela chicoteia o rosto do jovem pintor, que se deleita ainda mais. Todos os dias passaram horas maravilhosas juntos até que o serviço já havia sido concluído. Ao terminar a pintura, dá-se o nome de “A Venus de Peles” e na hora de pagar, o pintor disse que estava bem pago. E assim continua essa outra fase de humilhações, ela sempre procurando um pretendente e ele sempre servindo e sofrendo, mas com prazer, embora ele fale que a dor de vê-la com outro é pior que uma bofetada na cara.

Mas era o que ele desejava? A crueldade máxima que um homem pode suportar é ser traído pela mulher amada? Existe uma indagação que somente na conclusão da obra se chegará a algo que dará respostas.
Ela se interessa por um grego chamado Alejo Papadopolis, que ela conheceu num cassino, um autêntico varão, que combateu em Cândia contra os turcos.

Gregório percebe que o interesse de Wanda é diferente dos outros que passaram por sua mão. Ela diz que ele é tão belo que perdeu a respiração e realmente esse relacionamento deu certo. Gregório já não existe mais para Wanda, nem se dá o trabalho de dar-lhe ordens. Ele é totalmente negligenciado e ignorado por ela. Acabou o contrato? Ou é o fim da fantasia para ambos? O fato é que não foi fácil Wanda se livrar de Gregório.
Quando ela fala que deseja servir a um homem de verdade e que sente esse desejo e necessidade, inicialmente Gregório escreve uma carta rompendo tudo, se despedindo e deixando-a livre do contrato e do que ambos haviam combinado.

Só que a liberdade somente poderia vir por vontade de Wanda e jamais do escravo, quer dizer, nunca ele poderia deixar de ser escravo, de cumprir uma ordem, de desistir quando lhe convém. Caso ela não desse a liberdade ele deveria se manter lá, mesmo que sem fazer nada, sem ser olhado ou percebido por Wanda, estava no contrato e dessa forma, se ele fosse embora seria ele quem estaria cometendo um grave erro, faltando com sua palavra de honra e seria um covarde ao fugir dela e da situação. O fato é que depois de enviar uma carta de despedida pelas mãos de uma das negras, desiste e volta arrependido, mas sua situação mental está tão perturbada que ele tenta matá-la com um punhal. Ela vendo o perigo, reata a relação como, mas não como escravo Gregório e dona, mas sim como Severino e a amante ou amada Wanda.
Certamente ela faz isso para não morrer, pois viu o quanto ele está atormentado e descontrolado e somente quando ele entrasse numa condição de submissão, é que ele estaria em seu juízo normal. Num certo momento ela consegue excitá-lo novamente e ele fica embriagado e totalmente excitado e se torna Gregório novamente, como se entrasse em transe.

Ela o amarra em seu quando e diz: “Hoje vou flagelá-lo de verdade!”. Era uma cilada, ela chama seu novo amante, o grego, que estava lá escondido e manda que o chicoteie. Ele, com o chicote as mãos pergunta a ela: “És cruel a esse ponto?” Ela responde: “Somente por prazer. Faz dele o que quiseres”. E começou a descarregar o chicote, enquanto Wanda assistia as lágrimas de Severino/Gregório escorrerem pelo rosto. Inicialmente ele descreve como uma espécie de encanto fantástico em apanhar pelo rival e ver o sorriso cruel de Wanda, mas depois o amor desvaneceu.

A conclusão é que o amor cego leva o homem a armadilhas que lhe estende a mulher: a miséria, a escravidão, a morte. Ela se casou com o grego e Severino ficou amargurado e a moral da história é que quem se deixa chicotear, merece-o.
Anos depois ele recebe uma carta de Wanda dizendo que o grego morreu em batalha e pensa: “Ou se é a bigorna ou se é o martelo”.
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