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Menino de Engenho

  • Foto do escritor: Fernando Carlos
    Fernando Carlos
  • 20 de fev. de 2019
  • 7 min de leitura

José Lins do Rego.


Essa é a primeira obra de uma série que se tornará uma trilogia sobre o ciclo do açúcar, mas já aponta para uma outra série de livros que vai tratar do cangaço tendo uma visão crítica do assunto. José Lins do Rêgo publicou cinco romances que ele chamou como "ciclo da cana". Todos eles têm em comum o panorama da decadência dos engenhos de cana-de-açúcar no Nordeste em detrimento do avanço das usinas no lugar do engenho. Menino de Engenho é o primeiro livro do ciclo, que termina com Fogo Morto, última publicação do autor e considerada sua obra prima.

De todos os autores dessa fase, esse autor é o mais lírico, com histórias mais pungentes onde o leitor entra imediatamente na história, já que o modo de escrever é como se fosse um diário de alguém com um olha saudosista e crítico visto pelo olhar de uma criança, que logo no inicio da obra é colocado que sofreu uma tragédia na família, em que o pai mata a tiro sua mãe e é internado numa no manicômio, o que poderíamos pensar num clima pesado, o autor já nos remete as lembranças do protagonista Carlinhos ao lado bom tanto com o contato com o pai que brincava no chão com ele e da mãe que tinha o maior afeto com a criança amenizando essa cena pesada, já que a obra inteira é leve, bastante descritiva, mas sempre com uma dinâmica em que não fica monótono, pelo contrário, nos leva a ter curiosidade de conhecer mais. Embora a época era do fim dos engenhos e substituição pelas usinas é neste ambiente decadente que Menino de Engenho se passa, num lugar ligado ao passado e à tradição escravagista e vista de form

a crítica. Com o surgimento das usinas como meio de beneficiamento da cana-de-açúcar, os engenhos começam a perder poder e importância no nordeste do país. Temos uma cena em que seu avô leva Carlinhos ao engenho do vizinho que já não refinava a cana, que estava falido e quase fechando, onde a chamné já não soltava fumaça e era chamado de fogo morto.

Menino de Engenho é escrito em primeira pessoa e possui como narrador a criança Carlinhos, mas contada quando adulto de forma que ele vê o passado com ternura e riqueza de detalhes, descrição do cenário nos levando a sentir o clima bucólico que começa no Recife.


Carlinhos perdeu a mãe aos 4 anos e, pela pouca idade não fica claro a causa ou motivação que levou seu pai assassinar a mãe com um tiro. Quem vem resgatar o menino é seu tio Juca para levá-lo a fazenda do seu avô. Ele se tornará o menino de engenho, já que o avô materno é um Senhor de engenho chamado Santa Rosa. Chegando lá, ao ter contato com o campo, fica encantado. O autor relata o cenário de forma poética e lírica e no faz sentir que estamos lá, sentindo a brisa do lugar e o cheiro do ambiente. O ambiente rural é também muito bem retratado, ressaltando-se os moleques com quem ele brincava, no caso o contato com seus primos e os passeios de trem, os banhos de rio, as idas à escola, os conflitos com sua tia megera, e todas as molecagens.


Logo que chega é recebido com muito carinho pela tia Maria e ao lado vê o avô, sisudo sentado como um homem de muito respeito, mas sério e fechado. Aos poucos, vai se familiarizando com o ambiente e seus familiares até então desconhecidos. A tristeza vai dando lugar à curiosidade de um menino diante do desconhecido. Os três primeiros capítulos falam da passagem da vida de criança para a vida de adolescente. O engenho é um lugar já mágico na imaginação do menino, que sempre escutava as histórias da sua mãe, mas que nunca tinha visto com seus próprios olhos.


O campo da cana e a casa-grande são figuras essenciais no romance. Será mostrado cada parte da fabricação do açúcar. A primeira coisa que ele vê é o engenho funcionando, moendo um resto da safra da cana. O mecanismo chama a atenção de Carlos: “Minha atenção inteira foi para o mecanismo do engenho. Não reparei em mais nada”.

A chegada dos primos de Carlos é sua introdução ao mundo sexual bem masrcante e detalhado. Permedo com a rotina da fazenda de Santa Rosa são intercalados a rotina do engenho, como as grandes chuvas e a cheia do rio que invade os campos da várzea e a visita de um cangaceiro na casa-grande de seu avó, que não seria uma invasão ou ataque,k esse cangaceiro é visita no engenho. Tanto que as crianças o vêem como um Hoob Wood do nordeste, um herói e até brinca de cangaço.


A visão romântica do cangaço não é a mesma visão que o autor trata em relação aos negros. A relação dos negros libertos com a casa-grande é de submissão e gratidão, enquanto o narrador possui certo encantamento com o universo dos ex-escravos, ele e percebe como sofrem mesmo depois da libertação, vê as desigualdades e a falta de oportunidade de sair dessa condição. A liberdade das crianças negras pelos campos é motivo de fascínio para o narrador que, apesar de muito livre, tem as obrigações de menino parente do senhor de engenho. Essa liberdade juvenil depois se torna servidão nos trabalhos do campo.

A senzala do Santa Rosa não desaparecera com a abolição. Ela continuava pregada à casa-grande,com as suas negras parindo, as boas amas de leite e os bons cabras do eito”


Carlinhos se encanta e se assusta com as histórias contadas pelas negras da viagem até o Brasil, lendas de lobisomem; tudo vai marcando sua infância. O menino vivencia o sofrimento com as secas e posteriormente as enchentes, quando seu avô e os outros senhores de engenho perdem tudo. Com isso, no engenho, o alimento fica escasso, mas mesmo assim os servos não o abandonam, num laço de fidelidade. Seu avô José Paulino diz que escravo tem que ser bem alimentado para poder trabalhar mais. Através dos passeios com seu avô pelo engenho para ver os problemas existentes, aprende como o homem tem que ser justo, duro, tendo caráter e bondade, ajudando quem precisa e merece, assim como faz Zé Paulino.


A primeira paixão de Carlos é uma prima mais velha da cidade que vai passar as férias no engenho. Apaixona-se por sua prima Maria Clara e tem com ela seu primeiro beijo. Ela volta para a cidade, e ele fica muito solitário, chegando a chorar. Na casa, é caçoado por tanto sentimento.

Um dia, chega uma carta do hospício onde seu pai está internado, e Carlinhos fica ciente da situação. Ele então fica com medo de ficar igual ao seu pai. Carlinhos tinha também muito medo de morrer. Por ter asma crônica, se sentia como um pássaro preso; não podia tomar banho de rio, brincar até tarde, pois podia ter uma crise. Era cercado de cuidados até que Tia Maria casa-se e ele se sente ainda mais sozinho e solitário. O casamento de sua Tia Mariazinha o abala de forma avassaladora.


A saída de Maria da casa-grande é quase como a perda de sua segunda mãe que tomava conta dele. Carlos passa a ficar aos cuidados da Tia Sinhazinha, que, mesmo sendo cruel, sente pena do garoto e começa a lhe dar carinho e passa a cuidar melhor dele.

Carlos é criado solto no engenho e as liberdades da criança começam a se tornar libertinagem de um pré-adolescente. Sua primeira experiência sexual é com 12 anos com uma mulher negra que cuidava dele chamada Zefa Cajá, e pega uma “doença de homem”. Quando descobrem o que houve, prendem Zefa e todos fazem piadas com Carlinhos, tratando-o como menino precoce, assim como seu avô. Carlinhos sente que é um menino feito para a maldade. Era qualificado como libertino, perdido, e não religioso. Carlos passa a ser um libertino que anda sempre atrás das mulheres no engenho. Sentia-se mal com tantos desejos sexuais.


Seu avô decide então colocá-lo num internato, como salvação. Carlinhos parte de trem, já sentindo saudade do engenho onde passou sua infância e aprendeu tanta coisa. A ida de Carlos para o internato começa a ser visto como a solução para o mau comportamento. Essa esperança de correção no futuro também serve como uma ampliação para as suas liberdades de criança. Meses antes de Carlos partir para a cidade, ele tem toda a liberdade do mundo. O romance acaba com a sua partida do engenho para o internato, mas existe uma intertextualidade com a obra “O Ateneu” de Raul Pompéia.


Análise da obra.

José Lins do Rêgo representante da segunda geração do modernismo, uma literatura propriamente brasileira e não uma emulação da literatura européia. Tanto os temas como a linguagem das obras abordam temas nacionais e esse não poderia ser mais apropriado, mesmo com a abolição escravocrata o romance possui enormes marcas do regime escravagista, como se no interior da Paraíba ainda existisse algo como a servidão. O protagonista sente a diferença de tratamento entre os brancos e negros. As figuras do feitor (pessoa responsável por supervisionar o trabalho escravo) e do eito (roça onde se trabalham os escravos) são imagens constantes na obra.


Através de uma linguagem brasileira e das imagens do engenho no Nordeste foi a grande inspiração para essa nova literatura rompendo com o movimento iniciado na semana de arte moderna em 1922. Uma escrita numa língua brasileira, com mais regionalismo que estrangeirismo.

Filme.

Menino de engenho (1965). Direção: Walter Lima Jr, filme de estréia do diretor. Sinópse: 1920, na Paraíba. Após a morte da mãe, o menino Carlinhos (Sávio Rolim) é enviado para o engenho Santa Rosa para ser criado pelo avô e pelos tios. Lá ele testemunha a chegada de um novo tempo, com o advento das modernas usinas de açúcar e as transformações econômicas e sociais pelas quais passa a produção canavieira, mudanças que irão afetar a vida de todos. Quando ele cresce e vai para o colégio, já não é mais o garoto ingênuo e inocente que chegou no engenho.


O filme é uma obra prima, e retrata fielmente a obra de origem baseado no livro homônimo de José Lins do Rêgo. Todo lirismos presente vivida na infância de Carlinhos marcada por perdas dolorosas, intercaladas por momentos de indescritível poesia e puro frescor lúdico, sem perder de vista a ascenção e queda dos engenhos trazida pelo advento das usinas.


Elenco excepcional, Savio Rolim como Carlinhos, Maria da Conceição, Antônio Pitanga, Geraldo Del Rey (Juca), Maria Lucia Dahl, Anecy Rocha (Tia Maria) e Rodolfo Arena com interpretações precisas, marcantes e convincentes, belíssima fotografia e admirável aproveitamento das Bachianas Brasileiras do meu grande ídolo e maestro soberano Heitor Villa-Lobos na trilha sonora. Obra prima do Cinema Novo, mais que isso do cinema brasileiro. Música composta por: Walter Lima Jr., Alberto Nepomuceno. Nota 10.

 
 
 

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