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O Ateneu

  • Foto do escritor: Fernando Carlos
    Fernando Carlos
  • 27 de mar. de 2019
  • 9 min de leitura

De Raul Pompéia.

A Ateneu é o que chamamos de obra prima, sendo assim, é inclassificável, embora fora escrito no auge da escola literária do Naturalismo e até existem elementos dessa escola na obra, não podemos dizer que é especificamente isso, pelo contrário. Sua escrita é complexa, difícil de ler e entender de imediato, extremamente bem escrito e bastante rebuscado que chega próximo ao Barroco. Existem passagens muito líricas, singelas e emocionantes, com grande carga emocional e que demonstra o lado psicológico dos personagens se igualando ao impressionismos do Realismo e passagens, como por exemplo o apego do protagonista pela astronomia que apresenta um simbolismo latente, enfim, uma obra dessa envergadura é algo raro e improvável numa fase em que as teorias de Darwin e o determinismo prevalecia. Uma obra gigante que ficou sem classificação que não seja uma obra prima.


Essa obra faz parte da escola literária Naturalismo, atende todas as características como a descrição dos personagens comparando aos animais, o zoomorfismo, está baseado em fatos reais e vividos pelo autor, seu enredo mostra de forma expressionista a alma dos personagens e não impressionista como as de Machado de Assis do Realismo e o formate é de tese, desenvolvimento e conclusão.

Existe três obras que ele faz referências diretas e i,m conto que faz referências indiretas. A primeira obra é o clássico dessa fase naturalista “O Cortiço” de Aluísio de Azevedo. O Ateneu é um colégio e assume o protagonista da obra, ele tem vida própria, os personagens aparecem e saem, vivem e morrem e o Ateneu vai se desenvolvendo até que no final paga fogo. O mesmo acontece com O Cortiço, onde tem vida própria, vai crescendo e desenvolvendo, no final também pega foto e é assim que acaba a obra com a morte do Cortiço/Ateneu no incêndio, os personagens são meros habitantes de um ser que tem vida própria independente de quem entra e sai.


A segunda obra, também uma referencia ao naturalismo, embora da frança é Madame Bovary, publicado em 1857, no caso a protagonista Emma Bovary de Gustav Flaubert, uma esposa insatisfeita que procura o amor fora do casamento demonstrando ser uma mulher avante do seu tempo. No O Ateneu teremos uma personagem chamada Ema, casada com o diretor da escola Aristarco e é infeliz no casamento e que vai ter um afeto mais sensual com o protagonista central Sérgio. Aqui mais duas referência indireta com o conto de Machado de Assis “Missa do Galo” em que um jovem de 17 anos, estudante também, tem um encontro bastante sensual com a esposa infeliz de seu parente na casa em que está hospedado na noite que antecede o Natal, em que ele está esperando dar meia noite para a Missa do Galo e se encanta com a mulher que fala de suas emoções até que um grito o faz sair, a mesma cena acontece em que Sergio está acamado sob os cuidados de Dona Ema, que o trata como sua mãe, mas quando estão somente os dois, existe até uma certa lascívia da Ema, uma certa sensualidade para uma mulher de 30 anos com um garoto de 12 anos.


O garoto se refere a ela como uma mulher Balzaquiana, fazendo uma referência direta a obra de Balzac “A Mulher de 30 anos” sendo que ele acaba se envolvendo de fato, mas é interrompido por um grito de que O Ateneu está pegando fogo e ele sai para ver e nessa hora Ema desaparece e não sabemos o paradeiro dela. Esse grito vai fazer com que ele pare de sonhar com a Ema e trazê-lo para a realidade. Finalmente o terceiro livro citado é a obra de Oscar Wild “De Profundis” quando Sérgio começa a descrever o que foi o fim do colégio O Ateneu. O livro inteiro é uma carta que o autor escreveu para o namorado dele que foi preso e nesse tempo ele faz sua confissão de amor, já que era homossexual assumido e aqui ele está fazendo uma comparação do desespero dele em ver seu amado na prisão com a do Aristarco de ver todo seu colégio pegar fogo, “De profundis” seria traduzido como o profundo da alma.


A obra é naturalista, está entre os cem livros essenciais da literatura brasileira. A escola que pretende mostrar a vida como ela é, fazer uma anatomia do caráter e as mazelas do mundo e portanto baseado em fatos reais, como são as lembranças do autor Raul Pompéia da sua passagem pela escola dos 11 aos 12 anos de idade e ele vai narrar em primeira pessoa de uma forma muito pessoal, bastante trabalhada seguindo a forma de seu ídolo Gustav Flaubert, sendo ele o personagem Sérgio, embora seja uma ficção, é fato que o autor seja homossexual e isso está retratado de forma discreta. O fato é que a obra é tão complexa, sua linguagem tão rebuscada que muitos a consideram barroca e embora devesse ser expressionista, já falamos que temos cenas descritas de uma forma tão lírica, narrado pelos sentimentos, pela dor que remete ao impressionismo, deixando de ser um realismo objetivo, mas altamete nebuloso e foi escrito em 1888 ano da Leia Áurea. O livro começa com o pai de Sergio dizendo: “- Vais encontrar o mundo meu filho. A ponta do Ateneu. – Coragem para a luta.” Aqui temos a referencia de que “O Ateneu” é o microcosmo que representa o mundo.

Raul Pompéia estudou numa escola semelhante chamada Abílio e sofreu horrores. A educação no século XIX era bastante rígida e voltada para a elite.


Logo no início temos a apresentação do diretor da escola o Sr. Aristarco, um homem vaidoso que é a representação de como funciona o colégio. Ele trata bem o aluno que o pai paga corretamente as mensalidades, melhor ainda quando o pai era muito influente e ridiculariza os que tiram novas abaixo da média em público, já que quando saia as notas eram faladas para todos e os que tiravam abaixo da média era ridicularizado pelo diretor. Além disso, se algum, aluno fazia algo errado, ele o humilhava na frente de todos, enfim, ele gostava mesmo de degradar e maltratar psicologicamente seus alunos. Isso incomodava demais o Sergio.

Na casa de Aristarco, além da sua esposa Ema, temos a empregada Angela, que significa anjo, mas que de anjo ela não tem nada, pelo contrário, ela é descrita como uma mulher quente, extremamente sensual perante os meninos. Já nas descrições dos alunos, Sergio vai mostrar que esteticamente os alunos eram meio que deformados, cada um tem um problema físico que se reflete também num problema psicológico e essa apresentação de forma grotesca como animais, é uma das características do naturalismo, o zoomorfismo ou expressionimo.


Dentre os amigos, ele vai conhecer o Rebelo, que faz uma advertência, que é típico do naturalismo onde os mais fortes sempre vencem e conquistas os mais desprovidos, mas no colégio existe uma espécie de proteção do mais forte ao mais fraco em troca de favores sexuais. Vejam que as meninas eram separadas dos meninos nos colégios. Existe na escola uma piscina em que os meninos vão tomar banhos coletivos, Ao redor da piscina existe provocações, os mais fortes humilhavam os mais fracos, brincadeiras que hoje poderíamos chamar de bulling. Um dos garotos mais fortes era o Saches, um garoto cheio de malícia com aspecto bonito, mas ele era um dominador. Como Sergio não sabia nadar, o Sanches fez uma brincadeira estúpida, jogando o Sergio na piscina e quando ele estava quase se afogando, o mesmo Saches foi lá e salvou o Sergio, que ficou muito grato e passou admirá-lo de forma mais sensual e exerce uma atração homo afetiva, ao mesmo tempo o Sergio tem um certo asco dele, pois ele é muito dominador, mas ele não consegue se livrar dele.


Sergio passa a se apegar a um misticismo e se torna devoto a Santa Rosália, numa forma de buscar na fé uma forma para se livrar do domínio do Sanches. Ele passa a carregar a figura dessa santa. Também ele passa a se interessar em astronomia, ele se apega as estrelas, pois representa o infinito. Ele se aproxima de franco, que é um aluno problema, se faz de vítima e faz muita confusão. Para se vingar das travessuras que acontece na piscina, ele tem uma idéia muito boa e convida o Sergio a ajudá-lo. Quebram várias garrafas de vidro e jogam, dentro da piscina, para quando os meninos entrarem cortar seus pés. Sergio entra nessa, mas se arrepende a noite e clama para a santa Rosária para que nada aconteça de mal. Seu pedido é atendido e no dia seguinte a manutenção esvazia a piscina e encontram os cacos de vidros. Um alívio para Sergio, Não acontece nada com os alunos, mas Sérgio acaba sendo castigado. O diretor chama então Franco e Sérgio de peraltas para humilhá-los frente de todos.


Sérgio aproxima-se então de Barreto, um amigo beato, e conversa sobre Deus e o temor a ele. Influenciado por Barreto, Sérgio reza, faz jejum, mas mesmo assim tira nota baixa. Revolta-se contra Deus. Após o afastamento de Barreto, decide seguir sozinho e almeja o cargo de vigilante, pois assim não precisaria da ajuda de Deus ou de amigo algum. Nesse momento ele resolve abandonar o misticismo. Ele coloca a figura da santa dentro de um livro na biblioteca e essa figura desaparece.

Sergio se aproxima de outro aluno chamado Bento Alves que é funcionário da escola como bibliotecário e era muito bom em oratória e literatura e Sergio agora faz parte agora de um grêmio literário chamado amor ao saber.


Existe uma trama paralela em que Angela, a empregada da casa do diretor estava tendo um caso adúltero com o jardineiro do Ateneu e seu marido descobre mata o amante. Bento Alves imobiliza o assassino no momento de fuga e vira um menino herói. Sergio assume uma posição feminina perante Bento Alves, levando Sanches a ficar com ciúmes. Os dois tornam-se amigos íntimos e inseparáveis; leem juntos poesias, livros, histórias. Chegam as férias e Bento vai visitar Sérgio em sua casa. Após a volta às aulas, os dois brigam, sem motivo algum. Porém, no calor da briga, Bento consegue fugir, mas Sérgio é pego por Aristarco. Confuso, ele agride o diretor. Sérgio fica à espera de um grande castigo, mas o diretor passa a tratá-lo com silêncio e a punição nunca chega. Bento sai do Ateneu.

Num passeio educacional no jardim botânico, Sergio e dá conta que o Ateneo é mais uma prisão do que uma escola, ele se sente aprisionado, sufocado lé.


É descoberta uma carta de amor trocada por dois alunos e assinada como Cândida. O diretor anuncia o conhecimento da carta e que uma investigação já tinha identificado o autor e os cúmplices. Aristarco humilha os envolvidos, principalmente Cândido, o autor da carta. O medo se instala no Ateneu, pois muitos conheciam a relação e podiam ser punidos como cúmplices. Em meio à todas as tensões, uma revolta começa no internato. Franco é agredido sem motivos por um inspetor, os alunos se revoltam e o caos é instalado no Ateneu. Além da agressão, a qualidade da comida também é motivo para a revolta.


Sergio vai ter uma última amizade com Egbert, um menino formoso de origem inglesa e vão ser carne e unha. Intitulado pelo narrador como seu único amigo verdadeiro, uma vez que era uma amizade sem interesses, apenas alicerçada em admirações sinceras. Egbert sempre tirava boas notas, e por essa razão foi convidado junto com Sérgio para um jantar na casa de Aristarco. Nesse jantar, D. Ema estava lá e Sérgio recebeu muitas carícias dela, reafirmando um amor platônico. Após esse acontecimento, ele sente-se homem e resolve se afastar de Egbert.

Há então na escola uma solenidade onde o Aristarco recebe um busto em cobre. Dividido entre o orgulho e uma competição com o busto, Aristarco o recebe orgulhosamente.


Franco, o menino problema, fica muito doente e morre de uma doença misteriosa, ocasionada por maus tratos no colégio e ao limpar o quarto encontram debaixo do seu colchão a santinha do Rosário que havia sumido na biblioteca. Sergio também fica doente, mas sua família esta viajando e teremos a cena em que Ema vai cuidar do menino e se insinuar para ele e é quando se escuta gritos que o ateneu está pegando fogo, provavelmente provocado por Américo e a escola tem o seu fim. Sérgio fica na casa do diretor recebendo carinhos de D. Ema, mas ela desaparece e Aristarco fica sem a esposa e sem a escola que ele tanto desejava.

A hipocrisia da sociedade é criticada por Raul Pompeia nessa obra. O ambiente cotidiano do internato, obscuro e opressivo, é contrastado com os grandes eventos do Ateneu.


Nas festas, a opressão se torna disciplina e o ambiente se transforma festivo e convidativo. O problema é que a homossexualidade de Raul Pompéia passou a ser evidenciado com a publicação do livro. Os repórteres passaram a investigar a vida de Raul Pompeia e isso ficou tão evidente que a briga chegou até Olavo Bilac, que afirmava que Pompéia era de fato homossexual e chegaram a marcar um duelo de espadas, mas para Bilac era apenas galhofa, só que o público ridicularizou Pompeia e ele se suicidou com um tiro no peito no dia 24 para 25 de Dezembro no ano de 1895, antes deixando uma carta pelo dizendo que ele cometia o suicídio para regatar a masculinidade e desmistificar a comparação dele com o personagem Sergio do seu próprio livro O Ateneu e morreu aos 36 anos de idade.

 
 
 

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